Outro dia, andava eu pelas ruas
da cidade quando, de repente, me deparo com um ser - só assim podia eu definir
- do outro lado da calçada, com suas calças desbotadas e uma aparência... uma
aparência... como posso dizer... uma aparência... um tanto quan-to...
estranha, digo assim.
De início, achei estranho, pois me olhava de uma maneira penetrante, que me envolvia de uma forma que não sabia eu explicar. Fui diminuindo meus olhos, franzindo já a testa, até conseguir analisá-la um pouco melhor. Feito. Era uma mulher, pude então reconhecer. Uma mulher que tinha por volta dos seus cinquenta e poucos anos; estava com aquela sua roupa suja - só depois pude reparar que também não levava calçados em seus pés - e seu cabelo... desgrenhado.
E aquele olhar ficou em minha mente. Passou terça... quarta... quinta; passou também a sexta. Já na manhã de sábado, quando me direcionava à famosa padaria do bairro, mais uma vez, para minha surpresa, os olhos penetrantes daquela misteriosa mulher me invadiam. Antes até que isso acontecesse, já caminhava em direção ao pão fresco do dia pensando naquela imagem estagnada em meu pensamento. (Que olhar poderia ser aquele!)
Dessa vez, então, um "Bom dia!" pude ouvir bem de fundo. Um "Bom dia!" diferente, com um quê de verdade, sabe... não aquele "Bom dia!" artificial, que damos a qualquer momento do dia a qualquer criatura que passe por nosso caminho. Não, aquele não era esse mesmo “Bom dia!”, ele era diferente, entrava pelos ouvidos com ar de desejo mesmo. [Mas por que um “Bom dia!” se o dia não parecia tão bom assim para ela?] E isso me intrigava. Parei. Pensei. Franzi a testa uma vez mais. Falei também: “Bom Dia!” E ela, então, sorriu. O meu não era tão quanto. Era muito menos que. Eu mesmo senti que era bem menos (que). Situação! Mas bastou.
Voltei a andar pelas ruas dessa
mesma cidade. Um outro olhar. Minha percepção... não mais a mesma. O caminho,
sim, esse era o mesmo. A padaria, os carros, homens, mulheres, ruas e “Bons dias!”. A
diferença agora estava em mim. Mudei. Cresci.
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